Muito já se falou sobre o termo "contraste": na verdade é só por causa dele que existem as imagens que vemos, não somente as registradas quimicamente ou eletronicamente mas também as registradas pelos nossos olhos. É assim que, excetuando-se meios especiais ou não comuns de captação/registro de imagens (sensores infravermelhos por exemplo), na escuridão total não existe imagem alguma, assim como pode tornar-se invisível o tradicional gato branco na neve...

Em outras palavras, uma imagem só existe para nossos olhos se existe contraste entre os diversos elementos que a compõem: o gato preto na neve e a vela acesa na escuridão ou ainda as sombras dos blocos de neve nos campos nevados e o brilho do recorte azul da Terra sob o fundo negro do espaço nas imagens espaciais são apenas alguns exemplos.

Quando tratamos imagens portanto, estamos considerando modelos luminosos cujo aspecto varia dos tons mais escuros aos mais claros, geralmente abrangendo uma grande gama de valores intermediários de intensidade. É fácil perceber, ao analisar uma fotografia P&B, as diferentes tonalidades de cinza ali existentes, assim como o branco mais intenso e o preto total. Essas referências - branco e preto total - são no entanto na maioria das vezes, muito relativas. É possível ter a mesma imagem, onde existe a sombra de uma árvore sob um dia ensolarado, com diferentes tons de preto para esta sombra, desde totalmente negro a diversas tonalidades de cinza-escuro. Do outro lado, o do branco, e sempre possível existir o "branco-mais-branco".

Isso acontece porque os meios químicos ou eletrônicos de que dispomos para o registro das imagens variam bastante em sua capacidade de registrar com maior ou menor fidelidade o verdadeiro branco e o verdadeiro preto, como nossos olhos os enxergam. E juntamente com isso, as tonalidades intermediárias de cinza.

Podemos montar uma escala, de um lado colocando a cor preta e do outro, a cor branca, supondo estes os de maior pureza possível. Quantas tonalidades intermediárias podemos então definir? A figura das escalas de cinza (figura1) mostra que se formos subdividindo cada vez mais esses tons obteremos cada vez nuances mais suaves entre uns e outros. Se tivermos um processo de registro de imagens que consiga registrar um número bem maior dessas tonalidades intermediárias do que outro, podemos dizer que ele consegue registrar uma latitude maior na escala de graduações de cinza do que outro que não consiga o mesmo.

Considera-se que normalmente o olho humano seja capaz de distinguir variações de intensidade luminosa em base em uma escala que vai de 0 a 100, do preto absoluto ao branco absoluto. O olho seria portanto capaz de distinguir variações iguais ou superiores a 1% entre um e outro degrau dessa escala. Variações de intensidade menores do que isso não seriam percebidas pelo olho. Diz-se assim que a escala perceptível é a latitude de determinado meio de reprodução de imagem.

É tradicionalmente conhecido o fato de que registros químicos (película fotográfica e cinematográfica) conseguem registrar imagens com latitudes superiores a de seus "concorrentes" eletrônicos, os sensores CDD e CMOSs. No entanto, este é um fato absolutamente não estático da parte dos sensores eletrônicos, que vem dia a dia superando suas limitações em termos de latitude com o desenvolvimento da engenharia envolvida no processo e que irá em um tempo não distante igualar e a seguir superar a latitude dos registros químicos.

Essa maior latitude do filme e da foto é um dos principais elementos, em meio a outros, como profundidade de campo (empregada no foco seletivo, etc...) que determinam o chamado film look de um determinado trabalho nessas mídias.

Se diferentes mídias e diferentes processos registram a mesma imagem com diferentes latitudes, isso significa, como vimos, que existem processos melhores nessa tarefa do que outros (por exemplo cinema x sensores eletrônicos atualmente). Mas o resultado obtido, dentro de um mesmo processo, também pode ser diferente. Isso porque todo processo de registro de imagens depende de um ajuste de exposição e esse ajuste pode ser efetuado de diferentes maneiras, tendo em vista o resultado que o fotógrafo deseja obter.

Formulada pelos fotógrafos americanos Ansel Easton Adams e Fred Archer no final da década de 30, a Teoria das Zonas permite obter o melhor resultado, em termos de exposição, visando chegar o mais próximo possível da estética esperada para determinada foto ou imagem em movimento.

Desenvolvida inicialmente para as chapas fotográficas P&B da época, pode ser aplicada também a outros meios de registro de imagem, como o cinema em película e a fotografia e cinema digitais. O objetivo é realizar a exposição adequada tanto das áreas mais claras da imagem quanto das mais escuras. O contraste, na fotografia, se por um lado é necessário para que existam as imagens, por outro é um dos maiores obstáculos para a realização de fotos de maneira geral nem super-expostas nem sub-expostas - à parte desvios como estes que sejam propositais (estética a cargo do fotógrafo).

Cada área de determinado tamanho em uma imagem qualquer tem seu valor individual de luminosidade: se este valor for maior, a íris tem que ser fechada em certo grau ou então o tempo de exposição tem que diminuir através do obturador. Se for menor, o inverso disso tem que ocorrer.

No entanto, como combinar na mesma imagem essas diferentes áreas, sendo que o valor da íris ou o ajuste do obturador são via de regra um só para o registro da imagem toda? Neste caso, algumas áreas dessa cena serão expostas adequadamente e outras não, quaisquer que sejam os valores dos controles de exposição utilizados na câmera, não há forma de desviar disso.

Já que não se pode então escolher expor corretamente todos os elementos da cena, a escolha natural recai sobre os elementos principais ou o elemento principal dessa cena. Para auxiliar nessa escolha, Adams e Archer desenvolveram a teoria das zonas.

Nesse processo é utilizado um fotômetro para medir as intensidades de luz em cada área específica da imagem. Existem fotômetros que medem a luz de diferentes modos: no processo de Adams e Archer empregam-se fotômetros do tipo luz refletida. Essa opção foi escolhida porque, para fazer os ajustes, é necessário medir a intensidade luminosa nos diversos trechos da imagem e muitas vezes pode ser impossível ou impraticável chegar perto desses elementos para medir sua luminosidade - caso do uso do fotômetro de luz incidente. Por outro lado, conforme visto, é necessário medir trechos específicos da cena: o fotômetro utilizado na tarefa não poderá efetuar a leitura geral da cena, como é feito na maioria das câmeras quando em modo automático de exposição.

A grande vantagem da técnica das zonas é sua ajuda em encontrar o melhor ajuste para expor corretamente o elemento escolhido, ao aliar o ajuste técnico com a percepção de realidade por parte do fotógrafo, unindo um processo mecânico a um processo manual. Assim por exemplo, quando um fotômetro é apontado para um pano preto na cena, tentará determinar o ajuste necessário de abertura da íris para expor corretamente o pano, o que poderá levar a uma exposição que resulte em uma tonalidade cinza, não preta, no registro desse trecho pela câmera. Nesse momento entra a ação do fotógrafo, que corrige o valor obtido para que a superfície apareça como preta e não cinza. O mesmo vale para a situação oposta, de muita claridade, como a neve acumulada no chão. Aqui entra a teoria das zonas.

Adams e Archer criaram uma escala numerada de 0 a 10 indicando onze diferentes zonas (intensidades de luminosidade). O valor 10 representa a zona do branco total, o valor 0 a zona do preto total e o valor 5 a zona do cinza médio. Quando a escala foi impressa, medições determinaram que a porcentagem de luz refletida por essa zona de cinza médio era de 18%. Esse valor ficou conhecido como cinza médio, ou neutro (neutral gray). Fabricantes comercializam cartões de cinza 18%: ao determinar a exposição para essa área média, o resultado esperado é a exposição adequada na maioria das zonas vizinhas, tanto mais claras como as mais escuras.

Para referenciar esses valores em seus textos diferenciando-os de outros valores numéricos, decidiram utilizar algarismos romanos para identificar as zonas, ou seja, I, II, III, IV até X, como representado na figura 2.

A zona 0 (zero) corresponde ao preto puro e a X ao branco puro. Entre os dois, localizam-se diversos valores intermediários:

  • I = tonalidade próxima do preto puro, não mostra textura
  • II = parte mais escura de uma imagem onde ainda é possível ver textura
  • III = textura das partes escuras das imagens
  • IV = áreas de sombras não muito escuras
  • V = ponto intermediário da escala
  • VI = áreas de sombras mais claras
  • VII = textura das partes claras das imagens
  • VIII = parte mais clara de uma imagem onde ainda é possível ver textura
  • IX = tonalidade próxima do branco puro, não mostra textura

A intensidade luminosa de uma determinada zona qualquer na escala é o dobro da anterior (à sua esquerda) e é metade da zona subsequente, à sua direita. Associando cada uma dessas zonas com a exposição obtida no negativo ou no sensor eletrônico, pode-se da mesma maneira dizer que a exposição correspondente a uma determinada zona qualquer é o dobro da exposição da zona anterior e metade da posterior.

Como, na íris das câmeras, os valores numéricos de f-stops também determinam o dobro ou metade da exposição em relação aos números anteriores ou posteriores de ajuste de abertura, é possível associar as duas escalas - esta é a chave para usar a escala nas câmeras.

Se imaginarmos uma parede branca iluminada por um refletor pouco potente e em outro ambiente, uma parede preta iluminada por um refletor muito potente, teoricamente a parede branca deveria refletir toda a luz que a atinge, mas parte dessa luz é absorvida. Por outro lado a parede preta deveria absorver toda a luz que a atinge, mas parte dessa luz é refletida. Isso ocorre, em ambos os casos, por imperfeições dos pigmentos que as compõem.

Assim, as duas paredes refletem luz e, fato interessante, dependendo da potência desses refletores, a luz refletida pode em dada situação ter a mesma intensidade nos dois casos. Isso se traduz para um fotômetro efetuando a leitura em cada um dos casos. O fotômetro indicará então a mesma exposição nos dois casos. No entanto, ao observar a imagem capturada com essa indicação, veremos que nem o preto ficou igual ao real nem o branco ficou igual ao real. É necessário então efetuar ajustes manuais - o que a teoria das zonas permite fazer.

A chave para resolver a questão é procurar o elemento principal da cena e colocá-lo na zona desejada. Para tanto, deve ser conhecida a faixa de zonas coberta pelo meio utilizado. Por exemplo um determinado negativo pode representar bem detalhes em áreas de sombra a partir da zona III. Assim, se o elemento principal da cena for escuro e necessitar ser exposto com seu detalhamento (e não de forma "chapada", com preto uniforme), o mesmo deverá ser colocado nessa zona, o que significa que essa exposição será obtida ajustando-se a íris da câmera para o valor correspondente a essa zona.

Se o elemento principal não possui essa tonalidade, mas ainda assim na imagem quisermos que os elementos mais escuros dela (mesmo não sendo principais) tenham textura, escolhe-se entre eles o mais escuro e coloca-se na referida zona. Com isso as demais intensidades luminosas da cena recairão cada qual em sua zona específica, sendo expostos corretamente.

Os sensores CCD e CMOSs nas câmeras fotográficas e de vídeo podem-se beneficiar do mesmo processo de ajuste. Para estes sensores, como vimos, de maneira geral a latitude representada em suas imagens é inferior às da película fotográfica, o que explica o fato das imagens de vídeo serem normalmente mais contrastadas do que as captadas em película e também sua conhecida dificuldade em representar adequadamente as inúmeras nuances de meios tons da imagem.

Problemas e questões que não muito tarde serão superados pela tecnologia, cada vez mais capaz de imitar, em grande estilo, os antigos processos químicos que ocorrem nas películas.

figura 1

figura 2