As primeiras câmeras surgidas na história não tinham lentes. Nem filmes, nem obturadores e nem íris, além de não serem nada portáteis. Eram caixas escuras, totalmente vedadas contra a entrada de qualquer luz e grandes o suficiente para caber uma pessoa lá dentro. E na verdade tinham sim, entrada de luz, mas somente a partir de um minúsculo orifício efetuado em uma de suas paredes. Na parede oposta, dentro da caixa, formava-se então (se o dia estivesse bem claro e sem chuva...) uma imagem do que era "visto" pela caixa, porém de ponta-cabeça. O expectador entrava lá para ver essa imagem projetada na parede e, muitas vezes, munido de papel e lápis conseguia reproduzir os traços da imagem com boa precisão, ao prender um papel ou tela na parede. Era a época das câmaras escuras.

Entrando-se na caixa e olhando para a parede, podia-se de fato ver a imagem do lado de fora, porém essa imagem além de depender da claridade do dia, não era normalmente muito clara e os experimentadores logo descobriram que aumentar o tamanho do orifício não era uma boa idéia. Isso porque mais raios de luz passavam com a abertura maior para o interior da câmara, mas a imagem se por um lado ficava mais clara, por outro lado perdia nitidez. Era preciso focalizar os raios certos no ponto certo, poucos raios e não muitos raios, porque isso fazia diminuir o que se conhece como "círculo de confusão", dando nitidez à imagem.

Foi então que descobriu-se um modo de captar uma quantidade muito maior de raios de luz do exterior da caixa e enviá-los para o seu interior, aumentando bastante o tamanho do orifício (que passou na verdade a ser um verdadeiro "buraco" feito na parede) mas não somente isso: encaixando-se nessa abertura, em formato circular, um objeto curvo, feito de vidro, conhecido como lente. Se os dois lados desse objeto de vidro fossem planos, teríamos ali uma janela comum de vidro, onde os raios que vem de fora atravessam para lado de dentro sem sofrer desvios em sua trajetória, quando se considera a trajetória antes e depois de atravessar o vidro (para os iniciados em Óptica, sabemos que raios que passam pelo vidro da janela de forma oblíqua sofrem desvio ao penetrar no vidro, mas este desvio é compensado na saída).

Mas ao tornar o vidro de nossa janela bem mais espesso e ao curvar suas superfícies (ou, pelo menos uma delas) dando à mesma uma forma convexa (curvatura voltada para fora), algo diferente acontecia com os raios de luz. Devido à regularidade da forma curva da superfície da peça de vidro, os raios de luz provenientes de um dado ponto no lado de fora convergiam todos para um mesmo ponto ao atravessar o vidro e atingir a parede. Ganhou-se com isso muito mais luminosidade na imagem e ao mesmo tempo muito mais nitidez: estava inventada a lente.

Mas se você prestou atenção na descrição acima, deve ter notado na descrição que os raios correspondentes a cada ponto da imagem convergiam para um mesmo ponto na parede. Esse ponto não ficava necessariamente na superfície da parede (seria extrema coincidência) e sim poderia ficar um pouco mais para trás ou um pouco mais para frente. Isso significava ter que "trazer" a parede mais para frente ou "empurrá-la" mais para trás para que o local de convergência dos raios coincidisse com a superfície da parede. Logo, é claro, percebeu-se ser mais fácil afastar ou aproximar a lente da parede do que a parede da lente. E estava inventada assim a lente focalizável. Esse é o motivo pelo qual precisamos girar um anel na objetiva para focalizar a imagem (ou acionar um botão que peça para um pequeno motor elétrico fazer isso por nós, muitas vezes comandado por um processador eletrônico analisando a imagem a todo instante, o conhecido foco automático). Esses acionamentos nada fazem além de afastar ou trazer a objetiva mais próximo do local onde encontra-se o CCD ou CMOS na câmera de vídeo, ou a película fotográfica ou cinematográfica no caso da foto ou cinema.

A Química viria logo a seguir contribuir com uma importante criação, ao dispor cristais de substâncias sensíveis à luz em uma placa de vidro de forma que, expostos à luz, tinham sua composição alterada. Deixando-se essa placa exposta por um longo tempo à luz, todos os cristais ficavam com sua estrutura química alterada. Deixando-se essa placa protegida da luz, nenhum cristal sofria alteração. Mas, e aqui encontra-se o detalhe importante, deixando-se a placa exposta por um determinado tempo à luz, a alteração nos cristais não era completa, os que recebiam mais luz alteravam-se mais, os que recebiam menos luz alteravam-se menos, justamente nos pontos mais claros e mais escuros que formam toda imagem. E assim era possível registrar a imagem projetada na parede sem ser necessária a construção das grandes caixas para que alguém ali dentro a copiasse em papel ou em tela. As lentes tornaram-se menores, a caixa tornou-se portátil e como era necessário interromper a exposição do filme em dado momento, estava inventado o obturador.

Logo percebeu-se então que era possível controlar outros parâmetros da imagem se, apesar de ser mantida a mesma lente na abertura da câmara - que agora, bem menor, ganhava o nome "câmera", se pudesse reduzir em determinadas situações a abertura por onde entrava a luz.

Com essa redução a imagem ganhava mais profundidade de campo, ou seja, olhando a cena registrada, tanto pessoas como objetos situados em primeiro plano (próximos da câmera) quanto os situados à meia distância ou os bem distantes, ficavam bem nítidos. Por outro lado, aumentando-se o tamanho da abertura, era possível deixar nítido algo em primeiro plano e o restante ao fundo (e na frente também) bastante desfocado. Estava inventada a íris e com ela começava a nascer a linguagem do cinema, mais tarde aplicada ao vídeo também: chamar a atenção do público para determinado elemento da cena.

Houve variações no desenho da construção da lente: diferentes formatos foram experimentados, com curvaturas maiores ou menores e logo se percebeu como isso afetava a imagem. Quando a curvatura da lente era mais pronunciada, a imagem formava-se mais próxima dela, o que obrigava o fotógrafo a aproximá-la do plano onde estava o filme. Ao trocar por uma lente mais fina (e esbelta), acontecia o contrário: para que a imagem fosse formada de forma nítida, era preciso colocar a lente bem distante do filme. Mas não era só isso, como dito acima, a imagem apresentava-se muito diferente em uma e em outra situação. Na primeira, podia-se ver muitas coisas ao redor da parte principal da cena: em uma paisagem, não só uma árvore na frente, próxima à câmera, como o céu, a grama, as montanhas ao redor e muitos outros elementos. Já na segunda situação, via-se praticamente só o tronco da árvore. Mas ele apresentava-se muito mais próximo do que antes. Estava inventada a lente grande-angular e a lente teleobjetiva.

E por falar em "objetiva", logo também as lentes deixaram de ser uma só e tornaram-se várias, encaixadas com extrema precisão umas próximas das outras, formando um conjunto cilíndrico conhecido pelo nome de objetiva. Sim, estava inventada a objetiva, e isso foi feito ao chegar-se à conclusão de que jamais seria possível construir uma única lente que produzisse uma imagem perfeita. Os raios de luz sofrem diversos efeitos (aberrações) ao atravessar as lentes, alguns devido ao próprio material de confecção da lente, outros devido à imprecisões em sua fabricação e outros ainda causados pelo próprio fim que se deseja delas, ou seja, existe um limite técnico para produção de imagens nítidas dentro de determinadas dimensões da lente. A saída encontrada foi a associação de lentes, onde uma delas corrigia os defeitos causados pelas demais.

Muitos e muitos anos depois a Óptica viria contribuir com outra engenhosa solução, desta vez um mecanismo para possibilitar aproximar a imagem ou afastá-la sem ser preciso trocar as lentes, com, aproveitando-se agora o ensejo, diferentes "distâncias focais" - termo usado para descrever as diferenças entre as distâncias onde a imagem projetada pelas lentes são formadas. As grande-angulares formam suas imagens próximas do filme ou CCD/CMOS, por isso tem distância focal pequena. Ao contrário, as teleobjetivas formam as suas imagens distantes do filme ou CCD/CMOS, por isso tem distância focal grande. E esse mecanismo permitia, ao acrescentar um conjunto de lentes móveis entre dois outros fixos dentro de um tubo, variar a distância focal. Estava inventada a lente zoom.

As lentes continuaram a evoluir, assim como as câmeras que as empregam. Fabricantes acrescentam películas anti-reflexo em suas superfícies e esmeram-se em detalhes de precisão na sua construção. Empresas renomadas - poucas, no mundo - fabricam lentes com qualidade superior, distribuídas para uso nos mais variados equipamentos e diferentes marcas de câmeras. Surgem lentes especializadas em diversas funções, como as destinadas especificamente a vídeo em High Definition.

Uma história que mostra a evolução de um elemento muito importante na câmera de vídeo ou cinema, derivado de um material a princípio muito simples, o vidro. Estava inventada a janela e tudo o que os cineastas nos fazem "ver" através dela.