A cena vai ficando cada vez mais para trás, no tempo, mas ainda há quem se lembre do barulho do "clic" emitido pelas câmeras fotográficas tradicionais, antigas, não digitais. Às vezes tímido, quase inaudível, outras mais escandaloso e outras ainda acompanhado do ruído do motor de avanço automático do filme, esse "clic" nada mais é do que o barulho do obturador da câmera funcionando.

Elemento básico do processo de registro de imagens, é ele que nessas câmeras determina o tempo que a película fotográfica fica exposta à luz. No mundo atual quase não se vêem mais essas câmeras, com a evolução da tecnologia os registros de imagens são agora feitos na forma digital. Cabem então algumas perguntas: essas novas câmeras, digitais, possuem obturador também? Se a verificação basear-se no ruído emitido por ele a resposta é não, basta lembrar das pequenas câmeras de bolso ou das embutidas nos celulares. Alguém poderá argumentar sobre o falso ruído emitido por algumas dessas câmeras, na verdade uma simulação do funcionamento do mecanismo das câmeras antigas que bem pode ser eliminado através de um simples ajuste de menu.

A conclusão então deve ser a de que essas câmeras não tem mesmo obturador, pois feito o ajuste, não se ouve mais nenhum ruído. Outro então irá argumentar sobre as câmeras digitais semi-profissionais, maiores e ainda as profissionais, onde ouve-se claramente o "clic" ao ser pressionado o obturador. E ainda outro, terá visto uma dessas câmeras funcionar sem ruído algum. Com que conclusão, então, ficar??

Na realidade, independente de fazerem ou não os famosos "clics", todas as câmeras, digitais ou não, precisam ter obturador. Isso porque o processo de registro de imagem feito no interior das câmeras digitais pouco difere do realizado nas câmeras de película. Nestas, o que fixa a imagem é uma transformação química efetuada pela luz sobre cristais de prata, especialmente preparados em uma emulsão que recobre o plástico (película). Nas digitais, o que fixa a imagem é a geração de energia elétrica efetuada pela luz sobre células fotoelétricas.

Tanto em um como em outro tipo de câmera, a objetiva projeta a imagem a ser captada sobre uma superfície plana. Nas câmeras de película, nessa superfície encontramos o filme fotográfico, nas digitais, o sensor (popularmente conhecidos como CCDs ou CMOSs, apenas tipos diferentes em sua estrutura mas que fazem o mesmo papel).

Uma imagem só é percebida como retrato de algum objeto se possuir contraste, o que fica evidente se imaginarmos um plano totalmente escuro ou totalmente claro, o negro ou o branco total não tem significado algum. Assim, toda imagem terá áreas mais claras e áreas mais escuras, com uma grande quantidade de meios tons entre elas. Levando esse conceito para dentro da câmera, iremos observar que sobre o filme ou sobre o sensor, recairão, projetados pela objetiva, áreas claras e áreas escuras, além das intermediárias citadas.

Se considerarmos o filme, onde ocorre uma transformação química, iremos notar que ela se expressa na forma de reação contínua e que isso faz com que o resultado da exposição à luz seja acumulado sobre cada cristal ali presente. Em outras palavras, uma vez iniciada a exposição a determinada cena, tem início a reação química sobre todos os cristais da superfície do filme. Onde há mais luz, a reação é mais rápida, onde há menos luz, mais lenta.

Não é difícil perceber que após algum tempo, teremos cristais que se modificaram mais e cristais que se modificaram menos, usando um linguajar mais simples para não citarmos propriamente as reações que ali ocorrem. Mas, justamente os que sofreram maior modificação estão nas áreas onde a objetiva projetou mais luz, ou seja, temos uma cópia da cena registrada na superfície do filme.

Se considerarmos agora o sensor das câmeras digitais, veremos que o processo é similar: ao invés de cristais, temos as células fotoelétricas, em tamanho minúsculo, cada qual definindo, isoladamente, um pixel na imagem. Da mesma forma, em determinados pontos da imagem haverá mais luz, em outros, menos luz. Ao invés de uma reação de transformação química, temos aqui um efeito (descoberto por Einstein) que se traduz na geração de energia elétrica. E, assim como mais luz faz com que a reação química sobre o cristal seja mais rápida, aqui, mais luz faz com que a voltagem da energia gerada seja maior (também, simplificando para não citarmos os processos físicos envolvidos com maior precisão).

Agora temos a imagem registrada tanto no filme como no sensor. Mas também, nos dois casos, temos um problema: de deixarmos ambos, filme e sensor, expostos por muito tempo à imagem projetada pela objetiva, ao final deste tempo todos os cristais terão sido alterados e todas as células terão gerado carga elétrica máxima. Com isso, todos os cristais alterados ou todas as células com seu limite de carga atingido não produzirão imagem alguma, teremos uma imagem totalmente branca.

É nesse momento que entra em ação o obturador: ele deve "cortar" o registro da imagem após determinado tempo, para aí sim, termos alguns cristais mais claros, outros mais escuros e da mesma forma a leitura de alguns pixels com mais carga, outros com menos. Essa leitura é exatamente o que vai ocorrer em seguida na câmera digital: o sensor é varrido de alto a baixo, gerando um sinal elétrico de intensidade variável (conforme os pixels tenham acumulado carga maior ou menos).

No caso da câmera de película, esse corte é feito tampando-se a entrada da luz, através de um mecanismo que emprega diferentes processos, como lâminas, cortinas, etc.. que bloqueiam a entrada da luz. E o registro tem início com o "destampamento", acionado pelo botão do obturador.

No caso da câmera digital, basta programar o momento de se fazer a leitura: o sensor pode ficar permanentemente exposto à luz, porque imediatamente antes de iniciar o registro é feito um processo de limpeza eletrônica ("zerando") todas as cargas, até o momento de ser feita a leitura.

Este processo eletrônico é muito mais simples, rápido e preciso do que o mecânico. Com ele, as câmeras digitais podem atingir valores inimagináveis de tempos curtos de exposição, algo impossível de se realizar, na prática, de forma mecânica.

Nas câmeras de vídeo também existe o mesmo processo, ou seja, um obturador.

Como vimos, sua função é controlar o tempo de exposição do filme/sensor à luz - existe sempre um tempo ideal de acordo com o objetivo proposto pelo fotógrafo naquela determinada cena. Esse controle denomina-se controle de velocidade.

Se ele for ajustado para um tempo muito curto de exposição o resultado deveria ser obrigatoriamente uma imagem escura. Mas nem sempre isso é o que ocorre, porque nas câmeras existe um outro dispositivo controlador da luz, a íris ou diafragma. Com ele é possível compensar uma menor entrada de luz devido a um tempo mais curto de exposição com uma abertura maior do diafragma. Claro que existem limites, tanto de um lado (diafragma) quanto de outro (capacidade de ajuste do obturador) e ainda outros decorrentes do tipo de objetiva utilizado, etc...

Mas, se é possível realizar, na maioria das situações, essa compensação, qual a vantagem do ajuste do tempo de exposição? A principal vantagem é o congelamento maior ou menos de objetos movimentando-se na imagem, ou do próprio movimento da câmera.

A partir do controle desses elementos básicos tem-se um sem número de possibilidades criativas à disposição do fotógrafo.

E de onde vem então o "clic" das câmeras maiores, as DSLRs (Digital Single Lens Reflex)? Esse "clic" nada tem a ver com algum obturador mecânico ali existente e sim com o ruído do subir do espelho do visor óptico para que a luz atinja o sensor localizado ao fundo da câmera...